grávida em trabalho de parto debruçada na bola de pilates e sendo apoiada por médica obstetra

Suplementação de ferro por via endovenosa na gravidez

Depois da reflexão sobre quais os motivos para fazer suplementação de ferro na gravidez, vou esclarecer as vossas dúvidas principais sobre a administração de ferro por via endovenosa (recolhidas na minha página de Instagram).

Quando tomar?

Quando se tem anemia por falta de ferro deve fazer-se suplementação com ferro. Essa pode ser feita por via oral ou  endovenosa e ambas são capazes de repôr as reservas de ferro, permitindo a recuperação da anemia.

A via oral costuma ser a preferida pelo risco de reações adversas graves ser muito baixo e o custo ser menor. Por outro lado, os efeitos gastrointestinais são comuns, muita gente não toma direitinho por esse motivo (ou por esquecimento) e implica um tratamento de vários meses.

A principal vantagem da via endovenosa é permitir a administração de uma dose mais alta de ferro de uma só vez, levando a uma correção mais rápida da anemia e resolução dos sintomas. A principal desvantagem é o custo e o facto de ter que ser administrado em meio hospitalar, com recursos disponíveis para tratar reações alérgicas que possam surgir.

Habitualmente, usamos ferro endovenoso no segundo ou terceiro trimestre quando:

– hemoglobina < 10 g/dL, principalmente se for no terceiro trimestre;

– intolerância ou incapacidade de manter a toma regular de ferro por via oral;

– grávidas com condições que interfiram com a absorção oral de ferro (por exemplo, após cirurgia bariátrica);

– o ferro oral não ser eficaz a melhorar a hemoglobina.

A decisão entre ferro oral ou endovenoso deve ser individualizada tendo em conta os fatores de cada grávida e a sua preferência (e também os recursos e custos associados a cada escolha).

Com ferritina muito baixa mas hemoglobina normal faz sentido fazer?

Não me faz sentido sujeitar uma grávida sem anemia (ou seja, com hemoglobina normal), aos riscos da administração endovenosa do ferro, sendo possível a toma oral. Mas, possivelmente, há quem tenha outra opinião.

Faz-se quantas vezes?

Podem ser necessárias várias tomas. Depende dos valores analíticos quando se diagnostica a anemia, do tipo de ferro usado e da resposta individual de cada uma a cada dose.

É esperado que os níveis de hemoglobina subam em cerca de 2 semanas (é o tempo que o corpo demora a produzir novos glóbulos vermelhos). Para quem não pode esperar 2 semanas por este efeito (situações graves, em que o tempo de espera traz riscos significativos para a mãe ou o bebé), fica a restar a transfusão sanguínea.

Após 2-3 semanas deve repetir-se as análises para ver a evolução laboratorial e perceber se é necessária mais alguma intervenção.

Quais os tipos de ferro endovenoso que existem?

Em Portugal os mais frequentes são o óxido férrico sacarosado e a carboximaltose férrica.

Têm perfis de segurança e eficácia semelhantes mas, geralmente, apenas é necessária uma dose de carboximaltose enquanto que costumam ser necessárias múltiplas doses de óxido férrico sacarosado.

A carboximaltose férrica é (bastante) mais cara… mas pode compensar se houver poupança no número de idas ao hospital.

Deve ser sempre diluído em soro?

Sim, costuma ser administrado diluído em soro numa perfusão lenta.

Causa mais alterações gastro-intestinais por ser uma quantidade maior?

A administração de ferro endovenoso não causa alterações gastrointestinais significativas (quando comparado com a via oral).

Quais os riscos e efeitos secundários?

As formulações mais antigas de ferro estavam associadas a um risco significativo de reações alérgicas graves. As mais recentes têm um perfil de segurança muito melhor. Contudo, continua a ser o principal motivo de relutância na prescrição de ferro endovenoso.

O óxido férrico sacarosado  leva com alguma frequência a náuseas, dor de cabeça e sintomas respiratórios (nasofaringite, sinusite, infeção respiratória superior). Menos frequentemente surge dor no peito, alteração da glicemia, diarreia/vómitos, reação no local da picada, dores musculares, febre, falta de ar ou tonturas.

A carboximaltose férrica tem como principal efeito secundário a hipofosfatemia (diminuição do nível de fosfato no sangue, acontecendo em mais de 10% dos casos). Menos frequentemente (1-10% dos csos) pode levar a alteração da tensão arterial, rash cutâneo, vómitos, reação no local da administração, tonturas ou alteração da função hepática. Também estão descritos casos de reações alérgicas, mas acontecem em <1% dos casos.

Por esse motivo, a administração de ferro endovenoso deve acontecer sob vigilância e na presença de profissionais capazes de reagir a uma reação alérgica grave.

Há presença de metais tóxicos?

Não encontrei informação de que existam metais tóxicos nos preparados de ferro para administração endovenosa.

Pode manchar a pele onde esteve o cateter?

Sim, se existir algum extravasamento para fora da veia.

Qual a altura da gravidez para fazer com menos risco?

Habitualmente evita-se fazer no 1º trimestre de gravidez por não existirem estudos de segurança.

É possível prevenir a anemia antes de engravidar?

Sem dúvida que a prevenção da anemia por deficiência de ferro é o melhor caminho. É um dos fatores avaliados na consulta pré-concepcional, permitindo um ajuste da dieta e/ou suplementação com ferro antes de engravidar.

Mas, mesmo com esses cuidados, não é impossível surgir anemia na gravidez por ser uma fase da vida em que o consumo de ferro está bastante aumentado.

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Referências:

Pavord S, Daru J, Prasannan N, et al. UK guidelines on the management of iron deficiency in pregnancy. Br J Haematol. 2020;188(6):819-830. doi:10.1111/bjh.16221

Lewkowitz AK, Gupta A, Simon L, et al. Intravenous compared with oral iron for the treatment of iron-deficiency anemia in pregnancy: a systematic review and meta-analysis. J Perinatol. 2019;39(4):519-532. doi:10.1038/s41372-019-0320-2

Auerbach M, James SE, Nicoletti M, et al. Results of the First American Prospective Study of Intravenous Iron in Oral Iron-Intolerant Iron-Deficient Gravidas. Am J Med. 2017;130(12):1402-1407. doi:10.1016/j.amjmed.2017.06.025

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