A obesidade é uma preocupação crescente no mundo e sabemos estar associada a várias complicações para a saúde, incluindo na gravidez e parto.
Algo pouco falado abertamente e sem moralismos é o impacto da adiposidade abdominal materna na qualidade da vigilância da gravidez. Ou seja, na capacidade dos exames ecográficos detectarem alterações relevantes de acordo com a adiposidade.
Comentários depreciativos gordofóbicos não têm vantagens e apenas levam a indignação e tristeza face ao acompanhamento obstétrico. Mas é importante falarmos sobre isto de forma humana e pragmática: para que quem planeia uma gravidez esteja informada de mais uma vantagem para a perda de peso pré-concepcional e para quem esteja grávida saber as implicações reais do seu excesso de peso e vantagem de menor ganho ponderal na gravidez, devidamente apoiadas por uma equipa multidisciplinar.
Por isso, indo directa ao assunto: ter uma maior adiposidade abdominal faz com que as ecografias tenham uma maior margem de erro e, por isso, durante a vigilância da gravidez podem não ser detectadas as alterações que seriam com índice de massa corporal (IMC) ou perímetro abdominal normais.
Também é influenciada a datação ecográfica da gravidez e o rastreio de alterações cromossómicas do 1º trimestre: é necessário mais tempo para se conseguir uma medição adequada da translucência da nuca e existe uma maior probabilidade de não se conseguir nenhuma medição adequada para incluir esse dado no rastreio.
Este facto ainda nos preocupa mais por alguns estudos mostrarem que a obesidade está associada a aumento do risco de algumas malformações fetais (ainda que seja um assunto em debate, por outros estudos não mostrarem esse aumento de risco).
É um facto que a gordura abdominal prejudica a passagem dos ultrassons. Quanto maior a distância que estes tiverem que percorrer, menor a qualidade da imagem visualizada. E sim, existiu alguma evolução nos aparelhos de ecografia permitindo frequências mais altas com uma maior penetração dos ultrassons e filtros no processamento da imagem. Contudo, a qualidade das imagens continua a não ser comparável à de grávidas com IMC normal.
Para compensar esta dificuldade, pode ser necessário realizar mais ecografias, eventualmente começando a avaliação morfológica mais precocemente no segundo trimestre e recorrendo com maior frequência à ecografia por via vaginal para complementar o exame abdominal.
É importante que as grávidas sejam informadas, de uma forma gentil e sensível, na relação directa entre o IMC materno, menor qualidade das imagens ecográficas e consequente aumento da probabilidade de não se encontrarem alterações fetais importantes por ecografia. E também que a ciência se foque em evoluir no sentido de permitir acesso a cuidados de saúde adequados a pessoas com diversos corpos.
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Referências: